Depois de um ano praticamente inativo, com uma breve passagem no Wordpress, o ‘Sobre Café e Cigarros’ retorna de onde basicamente parou: nas listas de melhores do ano. Se 2011 foi atribulado a ponto de que eu não desse a merecida atenção pro blog, o mesmo não me impediu de escutar pouco mais de 250 discos lançados neste ano (considerando aqueles que escutei mais de duas vezes), entre internacionais e nacionais. Número que, acredito eu, não corresponda nem a mínima parte das produções que saíram ao longo ano, e não falo apenas os de origem anglo-americana, mas de outras partes do mundo, o que revela displicência da minha parte que não me aventurei em outros terrenos (pretendo reparar no próximo ano), embora dos pouquíssimos que escutei não me entusiasmaram.
- 5 menções honrosas (em ordem alfabética)
'Queens of hearts'
Noah Lennox expande os caminhos criados no seu elogiado disco anterior, Person Pitch, e cria uma obra que, mesmo sem a mesma liberdade e fluidez de outrora, leva as suas experimentações sonoras a um caminho confortável (ao seu modo), mas ainda imprevisível.
'Afterburner'
Depois de um esquizofrênico disco de estréia, Pélico retorna com uma coleção de canções românticas que namora o brega setentista (Odair José é a principal referência que se sobressai) e absorve do cancioneiro popular o passional das relações amorosas.
Sonoramente falando, pode não ser um dos discos mais imponente da cantora, mas o mesmo não se pode dizer quanto aos seus versos: narrando os horrores de uma Inglaterra em guerra, PJ Harvey toma pra si a missão de documentar, de forma pessoal, toda a barbárie que encontra e cria uma obra de conteúdo forte e contundente.
'The Words That Maketh Murder'
A inspiração que levou a criação desta obra (experiência?), que extrai de vinis antigos uma fonte que ajuda a lembrar de imagens do passado, foi uma cena de ‘O Iluminado’ (1980). Mas tal como o monólito de outro filme de Stanley Kubrick, ‘2001: Uma Odisséia no Espaço’ (1967), é um objeto insólito que causa espanto e admiração.
'Camaraderie at Arms Length'
Um disco que, a princípio, me frustrou. Excesso de introspecção, domínio de elementos orgânicos e, contrariando as minhas expectativas, um disco nada arriscado. Mas, após várias audições, comecei a descobrir o que acontecia aqui: ao ignorar a força criativa da banda e o seu constante processo de amadurecimento, não tinha percebido que, mesmo adotando uma sonoridade mais serena e comportada que nos discos anteriores, estavam aqui às mesmas nuances e dramaticidade que sempre me comoveram.
18 | Bon Iver | Bon Iver
16 | Vanguart | Boa parte de mim vai embora
Com todas as músicas cantadas em português (com exceção de ‘Mi vida eres tu’, que apresenta trechos em espanhol) e com uma linha temática que unem as músicas, sem nunca soarem repetitiva, Vanguart finalmente alcança uma unidade, ao contrário do registro anterior que continha boas canções agrupadas de forma desordenada. Amadurecendo sem alterar a sua identidade, a banda ressurge aqui, após um hiato de cinco anos, com um punhado de canções amarguradas que, refletindo as dores de um sofrido amor, são permeadas por um lirismo confessional e plausível, tão próximos de nós a ponto de relembrarmos e, dolorosamente talvez, reavaliarmos antigas paixões.
15 | Tyler, The Creator | Goblin
O diário de um adolescente em fúria, que expõe sem pudor, em letras escatológicas e hediondas, o seu asco em relação às coisas que o rodeiam. Aqui não há uma coerência, o autor escreve de forma compulsória, urgente, deixando expostas as arestas que revelam os seus piores defeitos. E se os seus escritos nos assustam e enojam, também sentimos atraídos com o que é contado, e acompanhamos com a mesma passividade que assistimos a uma de fita de horror. E eis a sua principal força: a oportunidade de nós acompanharmos algo que consegue nos tirar do torpor que impede de vermos um mundo imperfeito. Mas antes de ficarmos hipnotizados com o discurso, temos que nos lembrar do que Tyler avisa logo nos primeiros capítulos: 'Não faça nada do que eu digo nesta música, ok? É tudo ficção'.
'A Creature I Don't Know' é um retrato de singer/songwriter que, aos 21 anos, demonstra possuir uma alma trovadoresca vivaz, narrando crônicas de uma garota aparentemente frágil, mas hábil a encarar criaturas desconhecidas que atravessam o seu caminho. Com um vigor herdado de Neil Young e em senso poético e melódico de uma Joni Mitchell, Laura Marling encontra-se, em seu terceiro disco, suficiente segura e confiante para explorar a sua destreza vocal que, aliada a uma competente banda, cria ambientações climáticas distintas para cada música, entregando para os seus ouvinte uma experiência narrativa sensorial.
13 | Wado | Samba 808
Wado leva o conceito de ‘do itself’ ao extremo, pois, não encontrando em selos/gravadoras uma melhor de forma de divulgar e distribuir o seu trabalho resolve lançar digitalmente, de forma gratuita o seu material, tendo em vista que o desapego ao cd físico do cantor. Porém, independente das discussões sobre arte x indústria que a sua atitude pode gerar, encontramos em Samba 808 um artista mais maduro, e confiante no material que ornou. Como em seus discos anteriores, Wado volta a misturar samba, funk e elementos eletrônicos com a sua sonoridade de identidade própria, mas aqui, aliado a parcerias que contribuem positivamente com a diversidade das músicas, surge mais coeso dentro da sua difusão, envolvente sem se histriônico e prestes a ganhar uma maior atenção que há tempos é merecida.
12 | WU LYF | Go Tell Fire to the Mountain
Em meios aos grunhidos exasperados e de difícil (ou nenhuma) compreensão do vocalista e orientados por arranjos calculadamente melódicos, embora incidam para um caos controlado, encontramos aqui, a princípio, um grupo de jovens inconformados com a ordem em que vivem e cobram urgências para que as coisas mudem. Mas analisando a fundo todo o discurso, começamos a notar que tudo soa ingenuamente juvenil, que exposto no Facebook ou capsulado em 140 caracteres nos deixariam ruborizados de vergonha alheia. Porém, o afinco e o suor com que defendem aquilo que o incomodam, real ou não, nos comovem e nos fazem lembrar de que, um dia, éramos como eles, e que hoje crescemos e passamos a viver comodamente com o status quo.
11 | Rômulo Fróes | Um labirinto em cada pé
10 | Shabazz Palace | Black up
9 | Destroyer | Kaputt
É o mais simples dos discos de Dan Bejar, quando ele atende por Destroyer, e também o mais completo. Diluído em um softrock que, por vezes, esbarra na pieguice do gênero, mas ainda sim com uma classe de quem mantém a elegância em momentos constrangedores, ‘Kapput’ caminha por uma atmosfera melancólica, que nos absorve para dentro das memórias de alguém relembra nostalgicamente um passado vivido em excesso e que hoje se encontra em uma triste decadência, mas que em nenhum momento perde a pose. E quem tudo nos conta vai sabiamente esculpindo as palavras, omitindo o que acha desnecessário e expondo sofridos dramas prontos para nos sensibilizar.
Tomado por uma irreverência que lhe é peculiar e com um humor despretensioso e debochado, Kassin criou uma obra em que onírico e nonsense constroem uma narrativa convidativa para adentrarmos nos devaneios do músico. Funcionando mais do que emanações de um crossover entre artistas que ousaram experimentar novas sonoridades nos anos 70, ‘Sonhador devagar’ é o reflexo de um artista que sabe dominar e fundir, como um experiente artesão, todos os abrangentes gêneros que lhe caem em mãos e, em conseqüência, criar pequenas gemas acessíveis a partir do incomum, talhando harmoniosamente um caminho que resgata o ato de explorar a rica diversidade musical brasileira.
7 | Lykke Li | Wounded Rhymes
Temos aqui uma garota que nos seduz com as diferentes personas que apresenta. Ora doce e delicada, mas sempre incisiva, ora irritadiça e de temperamento arredio, Lykke Li se expõe intimamente ao longo disco, narrado as duras experiências das relações conturbadas que tivera e tirando proveito para seguir mais madura e preparada o que a vida lhe reserva, ao invés de remoer situações que estacionaram no passado e mostrar-se integra diante do cônjuge que a perdeu. E mais, como uma heroína despida de qualquer artifício, que se posiciona na frente do campo de batalha e em meio às batidas tribais, ela desfia os seus adversários e os subjuga não permitido assim que alguém machuque os seus preciosos sentimentos.
6 | Nicolas Jarr | Space Is Only Noise
4 | The Weeknd | House of balloons
3 | Girls | Father, Son, Holy Ghost
Se em ‘Goblin’, petardo de Tyler the Creator, tínhamos o diário de um adolescente em fúria e em ‘Go Tell Fire to the Mountain’, a enfurecida estréia de WU LYF, uma carta - manifesto de uma juventude que quer mudar o mundo, iremos encontrar aqui o caderno de anotações de um jovem ‘in love’. Escondidas por trás de uma sonoridade grandiloqüente, cuja imponência demonstra uma tendência das músicas soarem como hinos, encontram-se canções cujas letras se revelam simples e maleáveis, deturpando a imagem matura produzida pela sua postura sonora. Letras essas que são como frases rabiscadas por um impulso de alguém que foi dominado pelo amor, sentimento que nos torna vulneráveis e nos impede de agirmos racionalmente, ainda mais se tratando aqui de um jovem cujas emoções não cabem em si. E é aí que encontramos a sua beleza: em meios as frases de efeitos que ruboriza e constrange percebemos o quanto sincero e inocente o sentimento é, e antes de cobrarmos uma densidade poética e sensações mais profundas temos que perceber que são apenas canções de amor, de uma pureza e desprendimento que, como tal, não precisa de esmero para nos impressionar
2 | Fleet Foxes | Helplessness Blues